O morgado Itaparicano:
Divisão política e ocupação territorial da Ilha de Itaparica

por Felipe Santos Peixoto Brito
Pesquisador do Maré de Março/ Itaparica.net

Resumo: O presente artigo busca demonstrar como se deu o processo ocupacional da ilha de Itaparica, e que fatos foram notáveis na construção da sua identidade territorial.
Palavras-Chave: Itaparica; Vera Cruz; Recôncavo baiano; Bahia; Ilha de Itaparica

Recorte do “Planno Geographico do Reconcavo, e Bahia de Todos os Santos,…” de José Joaquim Alves, Nanquim e aquarela sobre papel, 1823, coleção Martha e Erico Stickel pertencente ao Instituto Moreira Sales.

A Ilha de Itaparica é um dos berços da civilização brasileira, tendo sido ocupada desde o período pré-cabraliano pelos povos indígenas brasileiros, com evidencia dos tupinambás que eram senhores da ilha no século XVI. O Território da Capitania de Itaparica e Tamaradiva teve grande importância econômica durante todo processo colonial com a produção de alimentos, trigo, uva e açúcar; além da criação de gado, destilarias e das indústrias baleeira, naval e da cal. A ilha de Itaparica tem uma posição estratégica, por ser a maior das 56 ilhas existentes na Baía de Todos os Santos, com 115,922 km² e 36 km de comprimento dominando as rotas marítimas como entreposto comercial entre o recôncavo e a capital, e também militar sendo alvo de invasões inglesas ainda no século XVI, e a partir de 1600, sucederam varias incursões holandesas contra a ilha, engenhos foram saqueados e incendiados, sendo que a ocupação da ilha em 1647 comandada por Sigsmund VonSchkoppe foi a mais eficiente investida militar contra a Bahia eles fortificaram vários pontos do Arraial da Pontadas Baleias e sabiam que ocupar Itaparica não ameaçava somente a Bahia, mas toda navegação no Atlântico sul.

Durante a guerra da independência, sob comando do capitão Antônio de Souza Lima a ilha foi palco dos mais memoráveis combates em terra e mar pela liberdade do Brasil,
dos estaleiros e marujos Itaparicanos surgiu a “Flotilha Itaparicana” a primeira força da Marinha Brasileira comandada por João das Botas e foi traçada a epopeia de 7 de janeiro de 1823. A partir de 1842 as aguas da ilha de Itaparica se tornam famosas como fonte de cura e rejuvelhecimento, e em 1937 é reconhecida com estancia hidromineral. Itaparica é uma das ilhas mais belas de todo mundo e o coração geográfico da Baia de Todos os Santos.

Período colonial

Em 1552, o primeiro Governador Geral Tomé de Souza doou a Ilha de Itaparica juntamente com Matarandiba como sesmaria a Antonio de Athayde primeiro Conde da Castanheira, mais tarde, em 1556, foi convertida em Capitania Hereditária passando a ser inclusa ao morgado instituído em Portugal pela mãe do Conde da Castanheira, Dona Violante de Távora em 1526.

O morgadio era uma instituição portuguesa que consistia na agregação dos bens de uma determinada família em posse de uma pessoa, geralmente o primogênito do casal instituidor, no intuito de não provocar a dispersão desses bens, a fragmentação da capitania em sesmaria dividiria a donataria em diversos bens diferentes que seriam doados a diferentes pessoas, fora da família do dono da capitania, o que iria de encontro à instituição do morgado. Por isso a capitania de Itaparica se configurava como a única capitania em que não havia a possibilidade de doação de sesmaria. Permaneceu sobre o domínio dos Condes da Castanheira até 1647, quando a ilha foi invadida pelos holandeses sob comando de Sigmund van Shop, permanecendo quase um ano sobre o seu domínio, que chegaram a construir fortificações e usar a ilha como base militar para atacar cidade de Salvador e o Recôncavo Baiano. Neste mesmo ano morre o 5º Conde da Castanheira também nomeado Antonio de Athayde, e a ilha passou para as mãos dos Marqueses de Cascais até o século seguinte quando,em 1742, novamente através de casamento entre umas das famílias mais nobres da corte portuguesa passou as mãos de Francisco Xavier Rafael de Menezes, Marquês de Louriçal, contudo, em 1763, o governo da metrópole mandou incorporá-la aos bens da Coroa, porém, em face dos protestos levantados por herdeiros, decidiu, em 1788, entregar o morgado itaparicano à D. Eugénia Maria Teles de Castro da Gama, 7.ª marquesa de Niza descendente do ultimo donatário, adentrando do século seguinte ainda como uma capitania hereditária inclusa em um morgadio português.

Em 1561 é Fundada a Freguesia da Vera Cruz de Itaparica, na metade da segunda década do século 19 ilha de Itaparica foi reconhecida como distrito,
com a denominação de Itaparica, pela resolução de régia de 02-12-1814 e alvará de 19-01-1815, subordinado ao município de São Salvador.

Brasil Imperial

No décimo ano do império, em reconhecimento ao feitos heroicos durante a Guerra da Independência o Distrito de Itaparica foi elevado à categoria de vila com a denominação de “Denodada Vila de Itaparica” pelo decreto imperial de 25-10- 1831, desmembrado de São Salvador e com sede na antiga povoação da Ponta das Baleias. Durante a Sabinada (1837-1838), Itaparica foi, por algumas semanas, sede provisória do Governo da Bahia. Em 1878, inaugurou-se o serviço de navegação a vapor entre o porto da Vila e Salvador, capital da Província da Bahia.

Período Republicano

Republica velha

O Itaparicano Virgílio Damásio foi o primeiro governador da Bahia no período republicano. Ele elevou a sua “denodada Vila de Itaparica” natal à condição de cidade com a denominação de Itaparica, por ato de 31-10-1890.

Estado Novo

Procurada ha muitos anos como estação de cura e repouso, a cidade de Itaparica foi oficializada Estância Hidromineral, através do Decreto nº 10.440, de 10 de dezembro de 1937.

Em 22 de agosto de 1942 é encontrado na antiga roça do padre João da costa, no Alto das Pombas, o terceiro poço produtor comercial de petróleo do Brasil na ilha de Itaparica.

Em 1943 é aprovado o plano de urbanismo da estância, que trouxe diversas modificações a feição antiga da velha Itaparica.

Quarta republica

As vésperas das eleições de 1962 a assembléia legislativa da Bahia, pela lei estadual nº 1773, de 27-07-1962 cria dentro do território da ilha de Itaparica o município de Vera Cruz, e pela lei estadual nº 1755 , de 30-07-1962, desmembra também do município de Itaparica o distrito de Salinas da Margarida sendo elevado á categoria de município.

Ditadura Militar

Em 1969 após vencer um processo de licitação, a Construtora Norberto Odebrecht inicia a construção dos terminais de Bom despacho, de São Joaquim, da ponte João das Botas (Funil), e da BA-001 para o Sistema Ferry-Boat planejado pelo estado, a viagem inaugural do sistema só viria a ocorrer em 1972. A partir dai com o crescimento do turismo de segunda residência a ilha passou a ser amplamente loteada para dar lugar as casas de veraneio das famílias abastadas de Salvador, em 1979 foi inaugurado o Club Mediterranée, primeiro resort construído no Brasil.

Atualidade

Com a decadência do sistema ferry-boat, o aumento dos preços dos imóveis com a especulação imobiliária, problemas socioambientais e o desenvolvimento do litoral norte de Salvador, deu-se início à derrocada econômica da ilha, com a extinção de postos de trabalho vinculados à atividade turística, trazendo pobreza e degradação. A partir 2010, o governo do estado da Bahia intensifica a proposição do sistema viário oeste, com o projeto da “Ponte Salvador –Itaparica”, a partir daí começa uma trabalho para criação/adaptação dos planos diretores urbanos dos municípios insulares, visando a redução dos impactos causados pelo projeto, e o desenvolvimento sustentável da ilha de Itaparica.